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50% dos pais não percebem sinais de comportamento suicida nos filhos

A falta de reconhecimento pelos pais pode resultar em intervenções tardias ou inadequadas

10/09 é o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, marcando a campanha Setembro Amarelo, que ocorre ao longo de todo o mês com o objetivo de alertar a população sobre a realidade do suicídio e suas formas de prevenção. Neste cenário, os jovens vêm demandando um olhar mais cuidadoso.

O índice de suicídio entre jovens no Brasil cresceu 6% ao ano entre 2011 e 2022, enquanto as notificações de autolesões na faixa etária de 10 a 24 anos aumentaram 29% ao ano no mesmo período. Esses números são superiores aos da população geral, onde o crescimento anual foi de 3,7% para suicídios e 21% para autolesões. Os dados são de um estudo realizado pelo Cidacs/Fiocruz Bahia, em colaboração com pesquisadores de Harvard.

Suicídio silencioso: uma questão preocupante é a falta de percepção dos pais sobre sinais e sintomas alarmantes nos filhos. Uma pesquisa publicada na European Child & Adolescent Psychiatry, com 800 adolescentes de quatro países europeus, revelou que 50% dos pais não reconhecem sinais de isolamento extremo e comportamento suicida em seus filhos.

Já um estudo publicado no Journal of Adolescent Health, incluindo 1.200 famílias de diferentes regiões dos Estados Unidos, mostrou que 45% dos pais não notam a gravidade dos sintomas apresentados pelos filhos, e 35% acreditam que esses comportamentos são “normais para a idade”.

Segundo Danielle H. Admoni, psiquiatra geral e da Infância e Adolescência, pesquisadora e supervisora na residência de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM); é comum que pais de adolescentes confundam sintomas de sofrimento mental com as mudanças típicas da fase.

“Muitos pais subestimam ou não percebem sinais de que seus filhos estejam com problemas que os colocam em risco de suicídio, o que pode resultar em intervenções tardias ou inadequadas”, sinaliza a especialista pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).

Um estudo realizado na Dinamarca revelou que 46,5% dos adolescentes que tentam suicídio realmente desejam morrer, enquanto apenas 2,5% o fazem para “chamar a atenção”, desafiando a ideia de que essas tentativas são meramente uma forma de atrair foco para si. Além disso, a pesquisa mostrou que 50% dos adolescentes relataram ter pensamentos suicidas por mais de um mês, sem haver apoio algum dos pais, agravando a intenção do suicídio.

 

Motivações e sinais de comportamento suicida: identifique e promova ajuda

Segundo a psicóloga Monica Machado, fundadora da Clínica Ame.C e pós-graduada em Psicanálise e Saúde Mental pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein; a adolescência é uma fase marcada por profundas transformações físicas, emocionais e sociais.

“Ainda que o suicídio esteja associado a uma complexa interação de fatores psicológicos, biológicos e genéticos, bem como culturais e socioambientais, há alguns aspectos que prevalecem nessa tomada de decisão, e os pais precisam se atentar a eles”, pontua a host do podcast Ame.Cast.

 

MOTIVAÇÕES

Tentativas prévias de suicídio: segundo a OMS, quem já tentou o suicídio tem de 5 a 6 vezes mais chances de fazer novamente. Além disso, 50% daqueles que se suicidaram já haviam tentado anteriormente.

Transtornos mentais: a OMS estima que 97% das pessoas que cometeram suicídio tinham algum tipo de transtorno mental, muitas vezes, não diagnosticado, frequentemente não tratado ou não tratado de forma adequada.

“Depressão, transtorno bipolar, transtornos de personalidade, esquizofrenia e transtorno de ansiedade generalizada são as condições mais associadas ao comportamento suicida”, cita Monica Machado.

Uma pesquisa feita pela Universidade de East Anglia, com 2.400 jovens com idades entre 14 e 24 anos, mostrou que os sintomas de ansiedade social (dois anos após a pesquisa) estavam significativamente associados a pensamentos suicidas e outros sintomas depressivos.

“Daí a importância da percepção e intervenção dos pais na saúde mental dos filhos. A falta do diálogo e a interpretação errônea dos sinais apresentados corroboram para o comportamento suicida iminente”, ressalta Danielle Admoni.

Bullying: segundo uma análise publicada no Journal of Maternal and Child Health, o bullying em adolescentes aumenta o risco de suicídio em 2,70 vezes em comparação com aqueles que não sofrem bullying. Pior: um relatório da Unicef aponta que 150 milhões de adolescentes sofrem bullying nas escolas e cerca de 720 milhões de crianças em idade escolar vivem em países onde não há proteção legal, como a lei federal brasileira n.13.185/2015, que refere o bullying como “intimidação sistemática”.

“O bullying envolve um ato de violência, seja física ou psicológica, realizado por uma ou mais pessoas de maneira intencional e recorrente, sem uma razão clara, provocando sofrimento e ansiedade, além de intimidar a vítima. No cyberbullying, o anonimato pode trazer uma vantagem ao executor do bullying, já que este pode atacar sem que a pessoa tenha chances de defesa”, explica Admoni.

Segundo a psicóloga, as vítimas do bullying, em geral, têm vergonha de contar o que estão sofrendo. “Cabe aos pais identificar comportamentos contínuos de tristeza, relutância em ir à escola, isolamento, irritabilidade constante, apatia, choro excessivo, baixa autoestima, entre outros que incapacitem o jovem de ter uma vida normal”.

 

SINAIS

Mudanças no sono e no apetite: “Fique atento tanto na insônia como na hipersonia, quando há sonolência diurna excessiva e/ou duração excessiva do sono; e nas alterações do apetite, seja comendo mais do que o normal ou menos que o de costume”, diz Monica Machado.

Queda no rendimento escolar: este é um sinal evidente de que há algo de errado com o jovem. “A depressão, por exemplo, altera a forma e velocidade do raciocínio, além da concentração”, elucida a psicóloga.

Automutilação: segundo Danielle Admoni, em média, 70% dos jovens que se automutilam acabam fazendo pelo menos uma tentativa de suicídio. “A autolesão está relacionada à incapacidade de gerir as emoções, fazendo da dor uma maneira de manifestar o sofrimento psíquico”.

Comentários negativos/pessimistas: frases como “a vida não vale a pena” ou “não vejo saída para os meus problemas” devem ser levadas a sério, pois podem refletir uma ideação suicida. “A sensação de descontrole dos próprios sentimentos pode levar à violência em jovens predispostos a esse comportamento, principalmente se confrontados com frustrações”, afirma Monica Machado.

Dores e alterações no organismo: sentir mal-estar frequentemente, e sem causa específica, pode ser sintoma de depressão ou outro transtorno. O indivíduo costuma sentir dor nas articulações e nos membros, dores nas costas, problemas gastrointestinais, cansaço excessivo, alterações da atividade psicomotora.

O que fazer? Segundo as especialistas, todos esses fatores, quando combinados com a dificuldade natural que os jovens têm de expressar seus sentimentos, tornam a prevenção ao suicídio ainda mais desafiadora.

Portanto, a primeira providência a ser tomada é buscar ajuda com profissionais de saúde mental. Normalmente, o tratamento envolve terapia, podendo haver indicação de medicamentos, a depender do diagnóstico. “Vale lembrar que, por mais importante que seja a rede de apoio, ela não substitui o acompanhamento médico e terapêutico”, pondera Danielle Admoni.

Para além da ciência: um dos preceitos básicos é estar sempre por perto. “Seja acessível ao seu filho o tempo todo, para qualquer demanda. Muitas vezes, apenas este ‘estar disponível’ já promove a sensação de acolhimento e segurança que seu filho tanto precisa”, pontua a psicóloga Monica Machado.

“Além disso, evite julgamentos precipitados e entenda que circunstâncias estressantes da vida podem ser fatores de risco para o suicídio de jovens”, finaliza Danielle Admoni.

Se você ou alguém que conhece estiver em sofrimento intenso ou crise suicida, entre em contato com o Centro de Valorização da Vida (CVV) no número 188 ou busque um serviço de atendimento em saúde mental na região – no Sistema Público de Saúde indicamos a Unidade Básica de Saúde (UBS) ou o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS).

 

Assessoria

Foto: Reprodução/Fortalecendo a Família

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