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ColunasGisa Veiga

Machismo estrutural na prática

Cenas que aconteceram há poucas semanas no Judiciário brasileiro:

Caso 1 – A imprensa noticia com destaque a presença de um bebê no Superior Tribunal de Justiça. Fato inusitado. O pai, o advogado Felipe Cavalazzi, tinha que participar de uma sessão e levou o filho Lorenzo, de um ano e 10 meses, porque era seu dia de ficar com a criança. A presença do bebê sensibilizou os juízes da Segunda Turma do STJ, por entenderem ser a criança prioridade. E decidiram antecipar o caso do advogado na lista dos assuntos do dia.

Fofo, não?

Caso 2 – A advogada Malu Borges Nunes, do Amazonas, teve tratamento oposto. Em sessão plenária realizada por meio de videoconferência (note-se, nem era presencial), foi constrangida pela repreensão e comportamento intransigente do presidente da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas, desembargador Elci Simões, por estar com a filha de seis meses no colo. O desembargador, de carranca, paralisou a sessão e repreendeu a advogada: “Isso prejudica os colegas. Não deixe que outras interferências, barulhos, venham atrapalhar nossa sessão porque é uma sessão no tribunal, não pode ter cachorro latindo, criança chorando. Se a senhora tiver uma criança, coloque no lugar adequado. São barulhos que tiram a nossa concentração. A senhora precisa ver a ética da advogada”.

Ambos os casos ganharam repercussão nas redes sociais. O advogado que levou presencialmente o bebê à sessão do STJ foi visto como um pai presente, cuidador, merecedor de tratamento especial e de todos os elogios possíveis. Nada contra.

Mas a advogada, com o bebê em casa e, igualmente, sem ter com quem deixar a criança, foi motivo de repreensão. Nenhuma empatia. Nenhuma compreensão. E ainda consideraram antiético o seu comportamento. E se fosse um advogado com o filho no colo? Será que teria esse mesmo tratamento?

Poucos entendem ou aceitam que existe o machismo estrutural no Brasil, assim como o racismo estrutural. Significa que há uma aceitação geral, por parte da sociedade, desses dois males, através de atitudes cotidianas das pessoas e instituições.

O psicanalista e filósofo Helio Hintze explica que o conceito de machismo estrutural se baseia “na construção, organização, disposição e ordem dos elementos que compõem o corpo social, dando sustentação à dominação patriarcal, enaltecendo os valores constituídos como ‘masculinos’ em direto e desproporcional detrimento dos valores construídos como ‘femininos’ em todas as suas manifestações, em especial na mulher e nas sexualidades não heteronormativas”.

Além de jornalista, sou advogada. Senti-me agredida como mulher, cidadã e profissional do direito. É necessário que no Judiciário, o lugar onde a justiça deve ser feita, as mulheres sejam tratadas sem os rigores do preconceito que a própria justiça, teoricamente, condena.

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