ESPECIAL – Avanço do mar destrói moradias e comércios no Litoral paraibano
Não é novidade que o avanço do mar no Litoral paraibano tem provocado mudanças significativas na geografia e causado impactos irreversíveis em diversas regiões praieiras do estado. Além da capital João Pessoa, que, há décadas, sofre com a erosão das falésias das praias de Cabo Branco e Seixas, o mar vem “engolindo” barreiras, monumentos e residências de municípios costeiros como Conde e Pitimbu, no Litoral Sul, e Baía da Traição, no Litoral Norte. (Via Jornal A União)
Em Baía da Traição, dezenas de casas já foram derrubadas pela força da maré. Além disso, o calçadão da Praça José Barbosa (a principal da
cidade) foi fortemente atingido pelas águas do mar em várias ocasiões. Recentemente, no mês de março, o local ficou completamente destruído após fortes ondas atingirem a área.
No município, este é um problema antigo que se agrava cada vez mais. Segundo o secretário de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do município, Aluizio José de Lorena, por duas ocasiões a gestão “foi obrigada” a decretar estado de emergência naquele trecho da cidade devido às consequências do avanço do mar. Ao todo, 22 casas foram completamente destruídas pelo mar somente este ano.
Ainda conforme Aluizio, atualmente, existem dois cenários preocupantes, sendo um deles a possível invasão do mar em um trecho de estrada de 3km, que dá acesso às aldeias Forte, São Francisco, Lagoa do Mato e Cumaru. Se isso acontecer, alerta o secretário, as aldeias vão ficar isoladas, sem nenhum tipo de acesso. O outro cenário é se a água do mar atingir a única fonte de recurso de água potável que o município possui, o Rio Sinimbu. “Este é o canal que fornece água para o perímetro urbano do município e algumas aldeias. Será preciso decretar um estado de calamidade pública, caso isso aconteça”, afirmou Aluizio.
De acordo com o professor do Departamento de Geociências da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e coordenador do Grupo de pesquisa em Geomorfologia e Gestão dos Riscos Naturais (Genat) da mesma instituição, Saulo Roberto Vital, a situação do município de Baía da Traição é uma das mais complicadas do Litoral paraibano. Para além de obras de contenção – que, na maioria das vezes, surgem
como medidas paliativas –, o geógrafo afirma que é necessário realizar um estudo técnico multidisciplinar aprofundado a fim de apontar as
melhores condições para mitigar o problema não só naquela mais também em outras áreas atingidas pelo avanço do mar. “Eu defendo que seja feito um estudo completo, envolvendo toda a região costeira do estado, levantando dados de vulnerabilidade da costa paraibana, de condições socioeconômicas e ambientais, para que cheguemos a um diagnóstico preciso da erosão na nossa costa e, com isso, possamos apontar as melhores soluções frente à essa questão (dos efeitos e das consequências) do avanço do mar”, ressaltou o geógrafo.
Além disso, Saulo Vital reforçou a necessidade de se considerar o contexto e as particularidades de cada situação e de cada local. “Cada área
tem sua especificidade e seus contextos. Enquanto na Praia de Carapibus (em Conde) há falésias erodindo, na Baía da Traição há a invasão
das construções na área da faixa de praia. Na hora de elaborar um estudo, tudo isso tem que ser levado em consideração para que seja a apontada a melhor solução”, indicou.
O avanço assusta os residentes de Baía da Traição. Em março, a área litorânea da cidade foi afingida por ondas de quase três metros que destruíram parcialmente a principal e primeira praça construída na cidade, a José Barbosa, onde estão diversos quiosques. Um projeto para a recuperação do espaço vem sendo pensado pela gestão. O prefeito do município, Serginho Lima, afirmou que aguarda a liberação de recursos federais para lidar com o problema, após encontro com parlamentares paraibanos e da apresentação do problema. “A gente continua dependendo de recursos na ordem de R$ 20 milhões para saber qual o melhor projeto a ser aplicado nas praias que estão sofrendo com o
avanço do mar. Existem duas soluções sendo discutidas, o alargamento da faixa de areia ou a construção de gabiões. Temos que saber o que melhor se adequa a Baía da Traição”, explicou.
O projeto da construção de gabiões é mais barato e, por isso, a captação de recursos pode ser facilitada. O projeto aguarda, ainda, estudos de
oceanógrafos para saber quantos gabiões serão necessários para conter o constante avanço do mar. Apesar dos constantes avanços da maré, a cidade não vem perdendo moradores. “Muito pelo contrário, a Baía da Traição vem ganhando mais construções. Tivemos um saldo positivo nos últimos anos com pessoas em busca de terrenos para construir suas casas”, comemorou.
A moradora da orla, Ana Paula Fidélis, mostrou que o avanço do mar já quebrou o terraço de sua casa, que fica nas imediações da praia. “Após a quebradeira, nós tivemos que consCom o objetivo de frear o avanço do mar nas praias de Baía da Traição e minimizar os riscos à população, representantes da Prefeitura de Pitimbu e pesquisadores da UFPB se reuniram, no início de maio, para debater o problema e traçar estratégias de solução.
Até o momento, segundo informou o secretário Aluizio Lorena, um grupo de geógrafos e especialistas em Meio Ambiente realizou um
levantamento fotográfico de toda a área atingida pelo avanço do mar no município e, em breve, será elaborado um relatório com todos os
apontamentos necessários. “Esse relatório vai orientar o estudo a ser feito pela UFPB, em parceria com a prefeitura, para que tenhamos uma real dimensão daquilo que o mar está fazendo na nossa região e qual será a proposta mais viável para a contenção da força da maré que, infelizmente, vem destruindo a via costeira da nossa cidade. Será um trabalho longo e demorado”, afirmou.
O secretário de Meio Ambiente e Recursos Hídricos também destaAutoridades e especialistas se reúnem em busca de soluções viáveis para o problema.
A professora e comerciante aposentada, Ivanilda Gomes da Silva, mais conhecida como Moça, contou que o avanço na orla da Baía da Traição vem causando prejuízos diversos e obrigando comerciantes e moradores a deixarem o local. “Eu era dona de um bar e restaurante onde também funcionava um forró nos finais de semana. Após a aposentadoria, ainda tentei alugar o espaço, mas não pude mais por causa do avanço do mar. Meus vizinhos que tinham comércio por aqui, estão se mudando para as aldeias São Miguel e Forte, com medo da destruição”, afirmou.
cou, sem dar detalhes, que já existe um projeto voltado à questão do avanço do mar em tramitação na Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema), elaborado pela Defesa Civil Municipal, que, se for aprovado, será enviado para Brasília, “a fim de conseguir o apoio e os recursos”.
Pitimbu também é atingido
Já no município de Pitimbu, a 56km de João Pessoa, quatro praias, pelo menos, estão sofrendo com o avanço do nível do mar. De acordo com um mapeamento realizado pela Secretaria de Turismo e Meio Ambiente da cidade, os pontos com maior incidência são Barra do Graú (próximo ao Tambazulike), Praia Bela, Pontal (na Fonte dos Milagres e próximo à casa das Irmãs Lourdinas) e Praia Azul. Nestes locais, segundo informou a assessoria da pasta, não existe mais restingas, ecossistema costeiro fundamental para a proteção das praias e equilíbrio ambiental.
Entre as medidas adotadas, está um projeto educativo e de conscientização (em elaboração) para ser desenvolvido com estudantes, pescadores e moradores de residências à beira-mar; e a instalação de placas informativas sobre crimes ambientais. Mesmo com contenções, o avanço segue afetando as construções.
Matéria assinada por Ítalo Arruda e José Alves no Jornal A União, edição de 28/05/2023
Foto: Roberto Guedes/A União