ESPECIAL: 25 anos da morte de Ivan Bichara
Cajazeirense, paraibano, político e escritor, o ex-governador da Paraíba Ivan Bichara foi um dos nomes políticos paraibanos que se aventuraram na literatura, a exemplo de José de Américo. Apesar do pouco resgate sobre sua trajetória à frente do Estado na década de 1970, o cajazeirense deixou um legado jurídico para a política e três obras literárias com temas fortes como o cangaço. Hoje, faz 25 anos de sua morte. (via Jornal A União*)
O poeta, escritor e professor da UFPB, Hildeberto Barbosa, hoje ocupa a cadeira 06 na Academia Paraibana de Letras, fundada por Ivan Bichara. No entanto, a sua ligação com o político teve início bem antes, através de trocas de correspondências. “Eu mandava para ele meus livros, ele também mandava para mim os dele, e a partir desse intercâmbio motivado pelo interesse na literatura criamos uma amizade. Isso me levou a ocupar a vaga que tinha sido dele, a cadeira 06. Ele é o fundador da cadeira, e eu sou ainda ocupante desta cadeira, que só teve três nomes”, disse.
Ao ocupar a cadeira de Ivan Bichara, em 1999, Hildeberto precisou escrever um discurso sobre a vida de seu antecessor na API. Com a preocupação de investigar ainda mais a contribuição do escritor na literatura paraibana, o professor pôde se aproximar ainda mais não apenas do poeta, como também do político Ivan Bichara.
“Era o escritor e o homem que pensava criticamente a literatura. Ele fez um governo bom na minha avaliação hoje, sério e sereno, muito ético, até porque ele não era um político profissional, não tinha aquela postura de políticos mais tradicionais. Ele destoa um pouco dessa tradição de personalidades fortes no mundo político, uma figura pacífica e conciliadora, essa é a minha visão do politico”.
Hildeberto destacou que as inclinações do escritor foi como teórico, crítico e intérprete da literatura. “Ele publicou um livro importante: sobre José lins do rego “o romance de josé lins do rego”, em 1971. Ele faz uma análise introdutória muito didática, esclarecedora, em torno de todos os romances que José Lins do Rêgo escreveu, contestando uma série de pontos de vista. A análise dele é um livro de referência hoje. Eu publiquei um livro sobre José Lins onde faço uma análise sobre o estudo dele. Essa leitura crítica é um dos pontos de partida para que os leitores possam compreender a relevância da obra de José Lins”, comentou.
Outra obra escrita por Ivan Bichara foi um ensaio sobre um romancista paraibano, José Vieira; “Ele escreveu esse ensaio chamando a atenção dos leitores para a importância desse autor paraibano que fez história em toda sua pujança. Ele tem esse lado, escreveu muitos trabalhos em conferência, sobre a teoria literária, falando da crítica, dos métodos de interpretação da literatura. Muito antenado sobre os estudos literários. Isso é curioso porque ele também era político”, disse.
Mas nunca se dissociou a figura de escritor e romancista que ele foi, deixou três romances todos editados pela jose olimpo, que tratam da realidade paraibana, com temas fortes como cangaço, envolvendo conflitos de ordem pessoal, joana dos santos, tempo de servidão e carcará, três romances que são suficientes para consolidar uma reputação de escritor.
Na avaliação de Hildeberto, a Paraíba tem esse traço de ter governadores com “um pé na política e um pé na área da imaginação”. A exemplo de José Américo, Ernani Sátiro e Ernani Sátiro. “Apesar das diferenças entre eles de posturas individuais, há um elo que os aproxima que é esse interesse com a vida cultural, não apenas política”, comentou.
Para o professor, a figura de Ivan Bichara deveria ser mais resgatada no meio acadêmico. “Ele é um homem que precisa ser recuperado, revisto, diria estudado, principalmente pelas novas gerações, é importante que as universidades, os cursos de pós-graduação, se voltem para essa realidade da produção literária da Paraíba. Eu particularmente estudei muito tempo no curso de letras e comunicação, nunca vi um estudo sobre a produção dele”, avaliou.
O político Ivan Bichara
O historiador e professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Charliton Machado, explicou que Ivan Bichara era um político cajazeirense, nascido em 1918, que conclui seu curso em ciências jurídicas pela tradicional faculdade de direito de Recife. Ao voltar para a Paraíba, ele encontrou um contexto de abertura política, após 15 anos do Estado Novo.
“Ele se insere nesse debate como candidato a deputado estadual e é eleito. No primeiro mandato participou ativamente como constituinte. Depois até presidiu a Assembleia Legislativa, tendo um papel muito importante do ponto de vista jurídico pela capacidade que ele tinha de articular determinadas ideias que estavam compatíveis naquele contexto com o que exigia o Brasil, de reformulação da sua estrutura política”, disse.
O professor explicou que os seus mandatos estaduais aconteceram num cenário em que o Brasil estava retomando sua agenda democrática após o governo de Getúlio Vargas. “Mesmo ele pertencendo a uma ala conservadora da política paraibana e brasileira ele vai ter um papel muito importante em grandes temas, com grandes debates de fortalecimento da democracia após 15 anos da Ditadura Varguista do Estado Novo”.
Além disso, ele teve um papel importante nas instituições onde ele passou. “Ele foi diretor do jornal O Norte, que à época era um dos principais periódicos que nós tínhamos na Paraíba e também teve uma atividade muito presente no mundo letrado. E inclusive tinha essa característica de ser um político que se devotava muito às letras”, explicou o historiador.
No cenário da ditadura militar, por indicação do Ernesto Geisel, ele foi um dos nomes escolhidos pela Aliança Renovadora Nacional, a Arena, e foi eleito na eleição indireta da Assembleia Legislativa para governar o estado da Paraíba, em 31 de março de 1975, onde ficou até 1979.
Segundo explicou Charliton Machado, o governo de Ivan Bichara foi marcado por seu legado de organização administrativa. “Durante seu governo a Paraíba conseguiu uma mudança no paradigma da gestão. Das condições administrativas até então muito arcaicas. Ele é muito lembrado pela modernização da gestão administrativa, da máquina administrativa do estado da Paraíba. Até pela sua experiência como consultor jurídico, como advogado e que tinha uma preocupação que o Estado alcançasse um nível de modernização em relação aos estados mais importantes da federação”.
Na definição do historiador, Ivan Bichara foi um político sem grandes ambições. “Por isso ele vai ser lembrado também como um político diferente. No debate da literatura regional e também do ponto de vista da imprensa da época ele é um político que é visto como alguém sem grandes ambições, sem esse protagonismo, sem um carisma e sem as ambições que marcaram a geração dele”.
Após uma derrota política em 1978 ele abandona a política. “Ele volta para o Rio de Janeiro com sua esposa para cuidar da família, cuidar da literatura, escrever, fazer uma revisão sobre o seu passado, memorialístico, e escreve sua autobiografia”.
Ele morreu em 11 de junho de 1988. Atualmente, Ivan Bichara foi homenageado dando nome ao viaduto do bairro de Oitizeiro, em João Pessoa.
Matéria assinada por Iluska Cavalcante no Jornal A União
Foto: Reprodução