Celular em sala de aula só é proibido na PB pelas escolas da rede estadual; uso atrasa aprendizagem
A discussão em torno do uso de celular em sala de aula tem se tornado cada vez mais frequente nos ambientes escolares, especialmente após a publicação do Relatório Global de Monitoramento da Educação 2023, realizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O documento apontou que o uso do aparelho pode afetar a memória e compreensão dos assuntos, bem como distrair os estudantes, levando-os a voltar sua atenção para outras atividades que não tenham relação com as da escola.
De acordo com o relatório, ao usar o celular, os alunos podem levar até 20 minutos para se concentrar novamente na aula. Além disso, em 2022, o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) já havia relatado que oito em cada 10 alunos brasileiros revelaram se distrair quando utilizam o aparelho, não aprendendo o que se espera nas aulas de Matemática. Por esses motivos, o uso do dispositivo na sala de aula já está sendo proibido em alguns países e em algumas cidades do Brasil.
Recentemente, um decreto aprovado no Rio de Janeiro, passou a proibir o uso de celular e de outros dispositivos eletrônicos dentro das escolas municipais. Não podendo utilizá-lo nem dentro e nem fora da sala de aula. Em janeiro, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte também aprovou uma Lei que não permite o uso de smartphones em salas de aula para fins não pedagógicos.
Aqui no Estado, desde 2009, quando os aparelhos ainda nem tinham a mesma diversidade de funções que têm hoje e nem eram tão acessíveis, foi sancionada a Lei Estadual nº 8.949 que proíbe o uso de telefone celular dentro das salas de aulas nas escolas da rede pública estadual. Valendo-se dessa norma, no ano passado, a diretoria do Liceu Paraibano passou a adotar essa legislação, suspendendo o uso dos aparelhos e permitindo somente com autorização prévia de professores com uso justificado para alguma atividade escolar.
Ádson Bruno Costa é professor de Biologia no Liceu Paraibano. Ele conta que inicialmente os alunos receberam bem a proibição, mas que a escola ainda está em período de adaptação. “Ainda precisamos pedir algumas vezes para alguns estudantes guardarem o telefone celular, mas eles atendem sem muitos problemas. Aos poucos, eles estão compreendendo que isso pode contribuir para direcionar melhor a aprendizagem”.
Bruno disse que sempre que ele e os outros professores precisam realizar alguma atividade direcionada que possa incluir o celular como ferramenta didática, eles o utilizam, principalmente como ferramenta para pesquisa. Mas também, para jogos didáticos, produção de vídeos, fotos para trabalhos escolares, glossário, dicionários, entre outros. João Paulo Rodrigues dos Santos é aluno do Liceu Paraibano e disse que concorda com a proibição.
Para ele, a concentração na sala de aula diminui muito por causa do celular. “Por exemplo, eu tenho amigos que têm dificuldade de concentração e também amigos diagnosticados com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) na minha sala. Quando chega uma notificação ou uma mensagem, facilmente o nosso foco sai, completamente, do conteúdo. Até para mim, que não tenho nenhum problema de concentração, é muito fácil perder o foco”, contou João Paulo. Apesar disso, ele conta que está tendo bastante dificuldade para se adaptar, já que está muito acostumado a “passar o dia no celular”. “Mas eu acho uma dificuldade bastante necessária para que a gente dê prioridade à escola”, ressalta o estudante.
Na rede municipal de ensino de João Pessoa (PMJP) não há nenhuma lei proibindo o uso de celular em sala de aula, porém há uma orientação para que o aparelho não seja utilizado, uma vez que as escolas possuem aparatos tecnológicos como tablets e chromebooks, Sala Google e Sala Matemática que auxiliam no aprendizado. A prefeitura disponibiliza para os estudantes, tablets que eles podem utilizar na sua residência como instrumento para fazer consultas das atividades, além de chromebooks para que os alunos utilizem em conjunto com o professor.
Segundo Elisson Dutra, diretor do Departamento de Robótica da Secretaria de Educação e Cultura Municipal, nos equipamentos são instaladas ferramentas para inibir o uso deles de forma equivocada, ou seja, que eles sejam utilizados só para acessar conteúdos pedagógicos. “Por exemplo, o professor vai dar uma aula de Geografia e ele fala sobre uma ilha no Pacífico. Para o aluno, fica muito abstrato ele visualizar aquela situação, então o professor pega informações sobre a ilha na internet e transforma isso num conteúdo pedagógico”, esclarece Elisson.
Como os aparelhos têm travas para que não seja permitido o acesso a alguns sites, Elisson explica que se o professor precisar utilizar algum aplicativo ou site que não esteja na lista dos permitidos, ele solicita a liberação. Conforme o diretor, 80% das 101 escolas municipais estão com os recursos implantados na sua totalidade. Uma das unidades escolares que dispõe desses recursos é a Escola Municipal Aruanda, que fica no bairro dos Bancários. Desde o início do ano letivo, a instituição está promovendo uma ação para proibir o uso do celular nas suas dependências. Para que isso aconteça da melhor forma, a diretora administrativa da escola, Ercilene Azevedo, disse que estão sendo feitas reuniões com os alunos, pais e os professores. Segundo ela, os estudantes estão sendo acompanhados por uma equipe multidisciplinar, tendo, inclusive, apoio psicológico.
De acordo com Cássia Freitas, psicóloga da escola, a decisão foi tomada quando observou-se que os alunos estavam tendo muita dificuldade devido à atenção que eles dispensam ao celular. “Há dois anos percebemos, por exemplo, que o rendimento na disciplina de Matemática está muito abaixo do padrão que sempre foi a Aruanda, que tem um padrão de excelência”. Ela explica que tudo está sendo feito com muito cuidado. “A gente está estudando caso a caso. Temos, por exemplo, um aluno autista, o celular não pode ser tirado dele, porque o aparelho é um dado de segurança para ele. Então, a gente está gradativamente implantando, mas em tão pouco tempo, já vimos uma grande diferença”.
Outro motivo que ela apontou para a adoção da proibição é que os estudantes estão usando o aparelho para agredir colegas e professores. “Enfrentamos muitas situações de cyberbullying aqui, entre eles mesmos. No ano passado, houve um caso em que o aluno fez um vídeo do professor sem autorização e postou no instagram perguntando se o professor era pedófilo”. O problema foi resolvido, mas ficou o alerta.
Foto: RDNE Stock projec/Pexels
Matéria de Alinne Simões para o Jornal A União – matéria completa você lê AQUI.