MPF, MPPB e DPE recomendam ética na comunicação sobre violência de gênero
Medidas posicionam a mídia como protagonista no enfrentamento da violência contra a mulher
Na manhã desta terça-feira (10), o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público do Estado da Paraíba (MPPB) e a Defensoria Pública do Estado da Paraíba (DPE) formalizaram, em evento realizado no auditório da OAB, em João Pessoa, a assinatura das Recomendações nº 10/2024 e nº 11/2024. O evento contou com a presença de jornalistas e representantes de diversos órgãos, instituições e movimentos sociais, e reafirmou o compromisso das instituições públicas em promover uma sociedade mais justa, igualitária e ética.
As recomendações, feitas aos meios de comunicação paraibanos, Secretaria de Comunicação da Paraíba (Secom) e a Assembleia Legislativa, representam um marco no enfrentamento à violência contra as mulheres e na regulamentação de contratações públicas relacionadas à comunicação. Os documentos foram elaborados a partir do Guia de Enfrentamento da Violência contra as Mulheres: Diretrizes para uma Cobertura Responsável foi desenvolvido pela Secretaria de Estado da Mulher e da Diversidade Humana da Paraíba (SEMDH-PB), em parceria com o Intervozes e o Observatório Paraibano de Jornalismo.
Papel da mídia
A Recomendação nº 10/2024 orienta veículos de comunicação sobre práticas éticas na cobertura de violência contra a mulher e feminicídios. As diretrizes incluem evitar sensacionalismo, proibir imagens apelativas e conteúdos que minimizem os crimes ou promovam agressores. O documento enfatiza o respeito aos direitos fundamentais, o papel educativo da mídia e a abordagem de marcadores sociais relacionados à violência. Recomenda treinamentos em direitos humanos, gênero e ética jornalística, criação de manuais de conduta e divulgação de contatos úteis para fortalecer redes de apoio às vítimas.
Entre os fatores considerados para a emissão da recomendação está o aumento de 30% dos casos de feminicídio na Paraíba em 2023 (34 casos, contra 26 em 2022), com a maior taxa do Nordeste (1,7 por 100 mil habitantes), o que evidencia a urgência de uma abordagem responsável pela mídia. Os recomendantes apontam que as práticas jornalísticas sensacionalistas e a exposição indevida de vítimas e agressores perpetuam estereótipos e normalizam a violência.
Dever do Estado
A Recomendação nº 11/2024 orienta a Secom e a Assembleia Legislativa a regulamentarem contratações públicas de publicidade para garantir compromissos éticos na veiculação de conteúdos sobre violência contra mulheres. As diretrizes incluem exigir o cumprimento da Recomendação nº 10/2024 e do Guia de Enfrentamento da Violência contra as Mulheres, priorizar empresas com boas práticas éticas, aplicar penalidades em casos de descumprimento e atualizar contratos com cláusulas que assegurem o cumprimento das recomendações, incluindo subcontratações.
Para emitir a recomendação, os órgãos consideraram que a comunicação pública, enquanto instrumento de transparência e cidadania, deve assegurar que recursos públicos sejam direcionados a empresas comprometidas com práticas éticas. Nesse caso, os recomendantes ressaltam que a inclusão de cláusulas específicas para a publicidade evita que recursos financiem práticas sensacionalistas ou discriminatórias, reforçando o papel educativo da comunicação.
Impacto esperado
Para a promotora de Justiça Rosane Araújo (que atua na defesa da mulher vítima de violência doméstica), o desafio no Estado Democrático de Direito é equilibrar liberdade, igualdade e respeito com o direito fundamental à informação. Ela destacou que existem informações que constroem e outras que destroem, e que, historicamente, as mulheres continuam sendo um grupo vulnerável. Rosane enfatizou a necessidade de desconstruir a cultura da discriminação, misoginia e naturalização de desigualdades, afirmando que ser humano exige respeitar as humanidades. Ela alertou que, na sociedade atual, corpos são relativizados em sua humanidade, com alguns considerados mais ou menos valiosos. Para ela, a democracia se caracteriza pela pluralidade, respeito à diversidade e intolerância a qualquer forma de discriminação, seja de gênero, etnia, ideologia, orientação sexual ou religiosa.
Já a defensora estadual Lorena Oliveira destacou os compromissos do Brasil no enfrentamento à violência contra a mulher, ressaltando que é um problema de toda a sociedade. Ela apontou o papel essencial da mídia na formação da opinião pública e apelou para que os meios de comunicação assumam sua responsabilidade social, divulgando casos de violência de forma ética, priorizando a proteção das mulheres e suas famílias.
O procurador da República José Godoy destacou a colaboração entre instituições na construção das recomendações e afirmou que o lançamento é apenas o início de um trabalho contínuo. Ele apontou a necessidade de ampliar a divulgação, dialogar com municípios e órgãos públicos, e garantir que contratos não sejam firmados com veículos que desrespeitem a vida das mulheres, reforçando o engajamento em boas práticas de comunicação com foco no respeito à vida.
A secretária de Estado da Mulher e Diversidade Humana, Lídia Moura, agradeceu ao MPF, MPPB e à Defensoria por transformarem as medidas do Guia de Enfrentamento da Violência contra as Mulheres em recomendações. “Somos muito gratas por transformarem essa produção, que nós trouxemos como um diálogo com a mídia, em recomendações que podem refletir em toda a sociedade numa nova ambiência nas notícias sobre questões de gênero”, afirmou.
Próximos passos
Os órgãos recomendantes acompanharão o cumprimento das recomendações e monitorarão os impactos das ações nos índices de violência contra a mulher e nas práticas midiáticas. As empresas têm prazos de 30 a 60 dias para apresentar relatórios de cumprimento e implementação.
Diretrizes
O Guia de Enfrentamento da Violência contra as Mulheres: Diretrizes para uma Cobertura Responsável, elaborado pela Secretaria da Mulher e da Diversidade Humana da Paraíba em parceria com o Intervozes e o Observatório Paraibano de Jornalismo, oferece orientações para uma cobertura jornalística ética e humanizada. O documento alerta contra práticas como sensacionalismo e revitimização, propõe diretrizes para respeitar a dignidade das mulheres, apresenta referências jurídicas e um glossário sobre tipos de violência. O objetivo é transformar a mídia em uma aliada na promoção dos direitos humanos e no combate à violência de gênero.