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Ecossistema marinho em João Pessoa está sob ameaça

O berçário de corais da Praia do Seixas, no Litoral de João Pessoa, pode estar ameaçado. Considerada de grande importância para a manutenção da vida marinha na região, a estrutura tem sido alvo de impactos humanos prejudiciais à sua integridade, incluindo atividades turísticas irregulares. Alimentação de peixes, com ração fornecida por guias de catamarãs, ancoragem de embarcações no local e pisoteio dos corais são as principais infrações identificadas pelo Conselho Gestor da Área de Proteção Ambiental (APA) Naufrágio Queimado, Unidade de Conservação (UC) que abrange o berçário.

Responsável pela gestão da APA, a Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema) sediou, na semana passada, uma reunião com representantes das entidades que integram o conselho, com o objetivo de elaborar medidas de mitigação dos problemas ambientais na UC. A ocasião contou com a participação das secretarias de Turismo e do Meio Ambiente da capital, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e de associações representativas de pescadores, ambientalistas e proprietários de embarcações turísticas, entre outros.

No encontro, foram indicadas ações como: a realização de campanhas educativas nas marinas; a instalação de placas informativas nas áreas de embarque e de desembarque de veículos; e o reforço na comunicação entre os órgãos fiscalizadores, como a Marinha e a Sudema.

Medidas emergenciais

A reunião também marcou o primeiro mês de execução do Plano de Ação Emergencial (PAE) da APA Naufrágio Queimado, documento que define as diretrizes e os procedimentos para a gestão eficiente do local, buscando integrar medidas de conservação, de uso sustentável e de monitoramento ambiental, além de fomentar e beneficiar o desenvolvimento do turismo responsável.

Para o superintendente da Sudema, Marcelo Cavalcanti, o PAE representa um avanço significativo na proteção da UC, uma vez que possui força normativa e permite um ordenamento eficaz das ações na área. “A Sudema também está fortalecendo a fiscalização e implementando um plano de comunicação para ampliar a sensibilização sobre as regras de visitação da Unidade de Conservação”, destaca Marcelo.

Conforme estabelecido no PAE, as práticas de turismo náutico e recreativo na APA Naufrágio Queimado devem seguir uma série de normas para a preservação do ecossistema marinho na região — cuja área, de aproximadamente 422 km2 , estende-se entre as costas de João Pessoa e de Cabedelo.

As regras proíbem, por exemplo: o pisoteio e a ancoragem nos corais; a retirada e o manejo da fauna e da flora; e a alimentação dos animais locais com ração. Já os animais domésticos são permitidos apenas dentro de embarcações, sendo vedada sua presença nos recifes. Outra restrição é a limitação do horário de visitação com barcos a motor, que deve ocorrer entre as 4h e as 18h, com exceções permitidas somente por meio de autorização da Sudema.

“Também é proibido o despejo de resíduos e o uso de âncora em áreas sensíveis, e o acesso de catamarãs é restrito aos previamente cadastrados junto à Sudema”, afirma Taissa Régis, coordenadora de Estudos Ambientais do órgão.

O PAE determina, ainda, diretrizes específicas para atividades turísticas de menor impacto: assim como as embarcações maiores, os caiaques não podem ancorar sobre os recifes, enquanto os adeptos do mergulho são proibidos de manter contato físico com organismos marinhos. Inspeções diárias Em meio aos esforços de fiscalização das ações na APA, a Capitania dos Portos da Paraíba (CPPB), que também é membro do Conselho Gestor da Unidade de Conservação, informa que vem intensificando o monitoramento do local, com inspeções diárias, focadas em garantir a segurança do tráfego aquaviário e a prevenção da poluição ambiental.

Além de verificar o cumprimento de normas náuticas pelas embarcações — como o acesso a coletes salva-vidas, com instruções de uso, e a apresentação do plano de navegação, com dados sobre saída, destino e horário de retorno —, os fiscais da CPPB podem efetuar autuações ao flagrar infrações ambientais ou acionar a Sudema e o Batalhão Ambiental da Polícia Militar para a adoção das medidas cabíveis.

Laboratório natural de proteção

Como explica Karina Massei, bióloga e pesquisadora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o recife da Praia do Seixas funciona como um laboratório natural de proteção a espécies de corais, algas e animais diversos, como tartarugas marinhas.

No entanto, esse tipo de estrutura tem enfrentado ameaças significativas de origem humana, incluindo poluição e turismo desordenado, além da atual crise climática. “Os recifes estão entre os ecossistemas mais vulneráveis do planeta às mudanças climáticas. Essas ‘cidades submarinas’, que sustentam 25% da vida marinha, podem praticamente desaparecer até o fim deste século”, alerta.

Devido ao aumento da temperatura das águas, gerado pelo aquecimento global, as zooxantelas, algas unicelulares que vivem em simbiose com os corais, produzem substâncias tóxicas e acabam, por isso, sendo expulsas por eles. Sem os nutrientes fornecidos por elas, os corais perdem sua cor e vitalidade, branqueando-se.

“Na prática, isso significa que o coral está fraco e, se não se recuperar em tempo hábil, pode morrer”, frisa a bióloga.

Para combater esse e os demais problemas no Litoral paraibano, Karina e outros especialistas da área desenvolvem, com o apoio do Governo do Estado e do Ministério Público Federal (MPF), o Programa Estratégico de Estruturas Artificiais Marítimas (Preamar).

Entre os objetivos da iniciativa, que mobiliza pesquisadores da UFPB e do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB), está a restauração ecológica dos corais na Praia do Seixas, por meio da replicação de colônias nativas, considerada uma das técnicas mais bem-aceitas do mundo para reverter a degradação desse tipo de ecossistema. O projeto prevê, ainda, a elaboração de um plano de monitoramento socioambiental participativo, voltado para o desenvolvimento de atividades de sensibilização e de promoção da ciência cidadã, junto à população, assim como o subsídio de serviços relevantes para o ecoturismo local.

“A criação de áreas marinhas protegidas e a gestão eficaz, aliadas a práticas de restauração, podem ser um dos caminhos mais promissores para um ambiente marinho sustentável, saudável e resiliente”, ressalta Karina. Também envolvido no empreendimento, o presidente da Fundação de Apoio à Pesquisa Programa de restauração ecológica tem apoio do governo da Paraíba (Fapesq), Antônio Rangel Júnior, enfatiza que “é inegável o valor desse ecossistema e de toda a área costeira” do estado. Por isso, ele defende que o setor turístico adeque-se às determinações de atuação na região. “Apesar de o turismo ser uma atividade econômica que cresce a cada dia, é necessário que isso seja feito de forma sustentável e com responsabilidade, e os órgãos responsáveis devem preservar esse patrimônio da humanidade”, finaliza.

 

Texto de Sara Gomes para o Jornal A União deste domingo, 16/2

Foto: Marco Pimentel/PBTur

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