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Estado da PB registra, por mês, até 150 denúncias de crimes cibernéticos; mas número de casos pode ser bem maior

A Paraíba está cada vez mais conectada à internet. De acordo com o Censo Demográfico de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 90% da população paraibana já tem acesso à rede mundial de computadores em suas casas. Mas é preciso estar atento, porque, proporcionalmente ao número de usuários conectados, aumentam, também, as ocorrências dos chamados crimes cibernéticos (ou crimes digitais).

Conforme aponta uma pesquisa realizada pelo DataSenado, instituto vinculado ao Senado Federal, 24% dos brasileiros com mais de 16 anos foram vítimas de algum crime desse tipo entre junho de 2023 e o mesmo mês de 2024.

“Hoje em dia, comete-se mais crime pela internet do que no mundo físico”, destaca o delegado João Ricardo Júnior, da Delegacia Especializada em Crimes Cibernéticos (Decc) da Paraíba, vinculada à PoliDelegacia.

Criminosos aproveitam-se da condição de anonimato on-line, da vulnerabilidade de alvos incautos e de programas ilícitos cia Civil do estado (PCPB). De acordo com João Ricardo, a unidade registra entre 100 e 150 casos desse tipo por mês, em todo o território paraibano, sendo que o total de vítimas pode ser bem maior, já que cada ocorrência pode afetar mais de uma pessoa.

O delegado explica que ainda não há um consenso, entre autoridades e especialistas do Direito, sobre o que exatamente define e distingue os crimes cibernéticos; mas, de maneira geral, considera-se aqueles que tratam de delitos on-line.

Além de se valer de fatores como a vulnerabilidade de usuários incautos e do acesso a programas ilícitos para burlar medidas de segurança, essas práticas disseminam-se por meio da condição de anonimato facilitada pelas formas de interação nos ambientes digitais.

Estelionato e extorsão

Conforme o representante da Delegacia de Crimes Cibernéticos da Paraíba, as ocorrências mais comuns da modalidade incluem extorsão, crimes contra a honra e crimes sexuais — principalmente, os relacionados à pedofilia. Outra ocorrência frequente é o estelionato, quando os criminosos utilizam-se, segundo o delegado João Ricardo, de artifícios para enganar a vítima e obter dela alguma vantagem — fingindo, por exemplo, ser um parente ou amigo que necessita de dinheiro, ou, ainda, o atendente de uma instituição financeira que precisa confirmar dados pessoais e bancários.

Júlia (nome fictício) foi o alvo indireto de um caso desse tipo. Ela conta que, na ocasião, recebeu uma mensagem de alerta, informando que alguém tentava acessar um e-mail secundário, vinculado às suas redes sociais. Sem dar tanta importância à notificação, Júlia acabou sendo surpreendida: “Depois, um amigo me avisou que tinham acessado meu Instagram”.

Outras contas pessoais dela, no Facebook, no LinkedIn e na Amazon, também foram invadidas pelos criminosos, que passaram a explorar esses espaços para anunciar a venda de móveis e eletrodomésticos, entre outros itens. Provavelmente, quem fechasse alguma negociação e efetuasse o pagamento não receberia nada; mas, felizmente, como relata Júlia, ninguém caiu no golpe, embora algumas pessoas tenham sido atraídas pelas ofertas. “Quando recuperei o acesso, algumas pessoas mandaram mensagens, dizendo que tinham interesse em comprar”, lembra.

Para retomar o domínio sobre seu perfil no Instagram, contudo, Júlia demorou cerca de dois meses. “Eu registrei um Boletim de Ocorrência e fui encaminhada para a Delegacia de Crimes Cibernéticos, mas acabei não conseguindo falar com o delegado, porque ele estava em uma missão externa. Também dei queixa no Procon, mas não adianta muita coisa, porque, para recuperar, tem que ser com a Meta mesmo”, observa ela, referindo-se à empresa responsável pelo Instagram.

Por outro lado, o incidente a fez desistir de voltar ao Facebook e ao LinkedIn, já que suas contas haviam sido deletadas. Ficou o aprendizado: hoje, Júlia revela adotar cuidados redobrados, como métodos avançados de proteção de perfis na internet, para não passar por situações como essa. “Eu já usava a autenticação de dois fatores e achava que estava segura, mas baixei um aplicativo autenticador”, afirma, referindo-se a um tipo de ferramenta que gera códigos para atestar a identidade do usuário.

Promoções atraentes

João Ricardo diz ser possível identificar os golpistas em episódios como o de Júlia, mas, caso alguma transferência de dinheiro tenha sido feita para eles, é muito difícil reaver a quantia. “Geralmente, eles criam contas falsas e transferem rapidamente o dinheiro, de uma instituição para outra. Em questão de minutos, esse dinheiro não está mais no sistema”, alerta.

Por isso, o delegado destaca a importância de os usuários não confiarem em e-mails ou mensagens que peçam informações, em nome de bancos ou outras instituições: “Se for o caso, entre em contato pelo canal oficial [da entidade], não simplesmente responda pelo mesmo e-mail; telefone, fale com o seu gerente”.

Já para os pedidos de ajuda financeira, supostamente enviados por um amigo ou familiar, a dica é ligar diretamente para a pessoa em questão, até mesmo por chamada de vídeo, a fim de confirmar a veracidade da mensagem. “Também não acredite em nenhum tipo de vantagem na internet, como promoções com preços muito abaixo do mercado, porque tem criminosos que criam sites falsos para isso”, complementa João Ricardo.

Outro cuidado diz respeito aos sites e aplicativos de relacionamento. O delegado recorda o caso de um homem que criou um perfil falso em um desses espaços e, depois de conquistar a confiança de várias mulheres, pediu-lhes fotos íntimas, passando a usar as imagens obtidas para chantageá-las. “Ele mostrava que sabia onde elas trabalhavam, que tinha contatos das pessoas do círculo social delas e que iria compartilhar as fotos se elas não fizessem o que ele queria”, comenta João Ricardo, acrescentando que o criminoso foi identificado e preso.

Legislação

De acordo com o advogado Wendley Steffan, não existe uma lei específica para lidar com os delitos informáticos, como ele prefere chamar os crimes cibernéticos, mas vêm sendo feitas alterações na legislação brasileira para abranger “novas condutas, que são praticadas no ambiente virtual e com o auxílio dos dispositivos informáticos”.

Algumas dessas práticas podem, inclusive, ser associadas a descrições já existentes no Código Penal. “Nós temos um artigo que aponta [o crime de] invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações, sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo, ou instalar vulnerabilidade para obter vantagem ilícita. Então, nós temos, aqui, a melhoria ou uma nova figura para aquele tipo penal preexistente”, aponta.

O especialista revela que advogados como ele são procurados, diariamente, para resolver problemas relacionados a ações criminosas cometidas na internet — desde os golpes mais simples aos mais elaborados, com o uso de engenharia social. Por isso, Wendley acredita que um combate mais eficiente a essas práticas necessitará não só de tipificações penais específicas, mas também de uma estrutura diversificada de resposta à sociedade. “Eu acho que esse é o principal gargalo do ramo do Direito Penal, hoje”, comentou.

 

Texto de Bárbara Wanderley para o Jornal A União 

Foto de Anete Lusina/Pexels

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