Candidatos da PB “mudam de cor” para abocanhar mais fundo eleitoral
Manoel Ludgério (PSDB), Inácio Falcão (PC do B) e Eliza Virgína (PP) deixaram de ser brancos e se “tornaram” pardos
Fruto de misturas de etnias distintas, o Brasil é um verdadeiro berço da diversidade de povos. Motivo pelo qual os processos eleitorais, mesmo que em números desiguais, refletem tal multiplicidade. Em 2022, no entanto, a questão racial entrou em discussões polêmicas movidas pela autodeclaração de candidatos como pardos nas eleições gerais. (via jornal A União)
Em 2020, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu pela distribuição dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão deve forma proporcional ao total de candidatos negros que o partido apresentar para a disputa eleitoral, que passou a vigorar neste pleito. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), compõem a comunidade negra as pessoas declaradas como pretas ou pardas.
A questão tem causado acusações em todo o país sobre candidatos que supostamente buscaram a nova resolução para adquirirem benefícios na corrida eleitoral. O caso mais emblemático e polêmico vem da Bahia, com ACM Neto (União Brasil) que concorre ao cargo de governador. Em um primeiro momento, o candidato se autodeclarou como branco quando registrou a candidatura no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), como apontam dados do sistema da corte. Na sequência, a declaração foi alterada para pardo.
A assessoria da campanha, porém, justificou que a primeira declaração como branco foi um “equívoco do departamento jurídico corrigido no mesmo dia ou no seguinte à publicação”, mantendo que ACM Neto sempre se autodeclarou como pardo.
O caso vem se tornando emblemático. Em entrevista na afiliada da TV Globo, ele disse “eu me considero pardo, você pode me colocar ao lado de uma pessoa branca, há uma diferença bem grande. Negro não, não diria isto, jamais”. Ao ser confrontado sobre pardos comporem a comunidade negra, o candidato sugere que o IBGE está errado ao compreender as populações dessa forma. “Então o erro é do IBGE, não é meu. Simplesmente isso”, falou em entrevista. Alguns eleitores apontaram, inclusive, que ACM teria realizado bronzeamento artificial para o período de campanha, que foi negado pelo candidato.
Todo o imbróglio vem fazendo com que ACM despenque nas pesquisas, saindo de uma possibilidade de vitória no primeiro turno para derrota no certame, vendo Jerônimo (PT) reduzir 28 pontos percentuais de vantagem.
Cenário na Paraíba
A situação não é exclusiva da Bahia. Em todo o Brasil, cerca de 33 deputados à reeleição mudou a cor para disputar as eleições, em comparativo entre os anos de 2018 e 2022. Alguns exemplos são José Rocha (União Brasil-BA), Professor Israel (PSB-DF), Heitor Freire (União Brasil-CE) e Luís Miranda (Republicanos-DF). Na Paraíba, Manoel Ludgério (PSDB), que concorre à reeleição como deputado estadual, se declarou como branco em 2018 e agora consta como pardo. Inácio Falcão (PC do B), também buscando a reeleição, se declarou branco em 2018, porém em 2020, antes da mudança que poderia o beneficiar, o candidato se autodeclarou pardo concorrendo a Prefeitura Municipal de Campina Grande. Outro exemplo é a Eliza Virgínia (PP), que concorre a Câmara Federal, se declarou branca em 2020 e mudou neste ano.
Em 2018, nas últimas eleições gerais, a Paraíba contou com 621 candidatos aos cargos de Deputado Estadual, Deputado Federal, Senado Federal, Governo do Estado e Presidência. A maioria dos candidatos, com o montante de 336 pessoas, se declararam como brancos, o equivalente a 54,11% do total. Pardos vieram na sequência com 231 representantes, significando 37,20%. Apenas 50 se declararam pretos (8,05%), três amarelos (0,48%) e um indígena (0,16%).
Já em 2022, a maioria dos candidatos se declararam pardos em um total de 752 candidaturas. São 340 pessoas declaradas pardas, o montante corresponde a 45,21%. Na sequência, brancos aparecem com 41,36%, equivalente a 311 que se autodeclararam. Pretos tiveram um aumento na representação, chegando a 97 pessoas autodeclaradas, um montante de 12,9%. Três pessoas se declararam como indígenas (0,4%) e um se declarou amarelo (0,13%).
Ao cargo de Chefe do Executivo estadual, Adjany Simplicio (PSOL), Major Fábio (PRTB) e Antônio Nascimento (PSTU) se declaram como pardos. A única candidata mulher, já havia se declarado como parda em eleições anteriores, como em 2020 e 2018, quando tentou os cargos de vice-governadora e vereadora, respectivamente. Também nas últimas eleições gerais, à época pelo PP, Major Fábio já se autodeclarava como pardo. Não há registros do candidato do PSTU nas últimas eleições.
Se declaram brancos João Azevêdo (PSB), Veneziano Vital do Rêgo (MDB) e Pedro Cunha Lima (PSDB). Nilvan Ferreira (PL) é o único que se declara preto concorrendo ao cargo.
Já para o Senado Federal, entre os oito candidatos, apenas Alexandre Soares (PSOL) e Ricardo Coutinho (PT) se declaram como pardos, segundo consta no TSE. Outros seis se declararam como brancos, sem nenhuma propositura de candidato ou candidata que se declara como preto para o cargo. O candidato do PSOL concorre a um cargo político pela primeira vez, por isso não há registro histórico de outros posicionamentos. No entanto, se declara pardo desde 1996, quando foi recenseador do IBGE. Alexandre ainda integrou, no ano de 2013, o Conselho Estadual da Igualdade Racial no Estado da Paraíba, como representante da Secretaria de Planejamento.
“Meu partido, PSOL, foi o partido que foi ao STF reivindicar a reserva de cotas nas eleições de 2020, para que as demais siglas também reservassem vagas e recursos a candidaturas negras. Fizemos isso, porque internamente, por meio de resolução interna do PSOL, já adotávamos a política de cotas no partido desde 2016, antes mesmo do STF exigir dos partidos, por força de uma ação movida por nós do PSOL. Desde 2020 as candidaturas do PSOL na PB do povo preto percebem valores adicionais, mas declaro que não recebi recursos adicionais para a nossa campanha por me declarar pardo. A propósito, nunca me vali de nenhuma política afirmativa (seja de reserva de vaga ou para acessar recursos) por me declarar pardo”, declarou o candidato.
Já o petista tem registros de declaração como branco desde 2014, quando o TSE iniciou a diferenciação de cor/etnia, como sugere a plataforma de dados, com a declaração dos candidatos. Em 2020, concorrendo novamente ao cargo de prefeito de João Pessoa, Ricardo Coutinho se declara branco. Pela designação como parto, a assessoria do candidato informou que houve um equívoco no momento do registro das informações do candidato à Justiça Eleitoral, pela qual Ricardo Coutinho acionou a justiça para correção.
“O candidato ao Senado Federal pelo PT, Ricardo Coutinho, autodeclara-se como branco, assim como fez em todas as eleições anteriores que participou. Houve um equívoco no momento do registro das informações do candidato à Justiça Eleitoral. O registro de candidatura é enviado pelo partido e o candidato pode peticionar no caso de alguma correção. Um encaminhamento para a alteração do dado já foi dado. Sendo assim, o erro será corrigido assim que for possível. É preciso enfatizar, ainda, que Ricardo Coutinho não recebeu nenhum tipo de beneficio financeiro por conta deste equívoco”, informou a assessoria em nota.