Defesa de partido nazista gera onda de repúdio
Deu no jornal O Globo:
A defesa da existência de um partido nazista no Brasil e da legalização de grupos que professam essa ideologia, feita pelo youtuber Bruno Aiub, o Monark, apresentador do podcast “Flow”, e pelo deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), respectivamente, gerou uma onda de repúdio que incluiu ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), presidenciáveis e entidades judaicas. Após anúncios de cancelamento de contratos de patrocínio, Monark foi desligado dos Estúdios Flow. A Procuradoria-Geral da República (PGR) abriu um procedimento para apurar se houve apologia ao nazismo por parte do youtuber e de Kataguiri, um dos convidados do episódio, conforme antecipou a colunista do GLOBO Malu Gaspar.
No programa, veiculado anteontem e já removido, Monark afirmou que deveria “ter um partido nazista reconhecido pela lei” e defendeu o direito de ser “antijudeu”. Em 2020, ele já havia declarado que conversaria “sem problemas” com Hitler.
Já Kataguiri, sob o argumento da defesa da liberdade de expressão, disse que proibir a existência de grupos nazistas não seria a melhor opção para combater essa ideologia: “O que eu defendo é que por mais absurdo, idiota, antidemocrático, bizarro, tosco que o sujeito defenda, isso não deve ser crime. Porque a melhor maneira de reprimir uma ideia antidemocrática, tosca, bizarra, discriminatória, é você dando luz àquela ideia pra que aquela ideia seja rechaçada socialmente e então rejeitada”.
A deputada Tabata Amaral (PSB-SP), que também participava do podcast, perguntou a Kataguiri se ele achava errado a Alemanha ter criminalizado o nazismo. “Acho”, respondeu o deputado, que completou dizendo que a melhor repressão seria uma “rejeição social” e não uma “sanção estatal” como a criminalização do nazismo.
O Flow, que conta com 3,6 milhões de inscritos em seu canal no YouTube, é hoje um dos podcasts de mais alcance do país. Políticos, artistas e jogadores de futebol – há um segmento dedicado ao esporte – deram entrevistas recentes. Em outro reflexo, o contrato de transmissão de partidas do Campeonato Carioca foi rompido.
Ministro do STF, Gilmar Mendes escreveu em uma rede social que a apologia ao nazismo é “criminosa, execrável e obscena”, enquanto Alexandre de Moraes destacou que “o direito fundamental à liberdade de expressão não autoriza a abominável e criminosa apologia ao nazismo”.
De acordo com a lei federal antirracismo, é crime utilizar publicações e meios de comunicação para disseminar as ideias do nazismo. Em caso de condenação, a pena é de multa e prisão de dois a cinco anos.
Pré-candidatos à Presidência, Sérgio Moro (Podemos), Ciro Gomes (PDT) e João Doria (PSDB) se manifestaram sobre o assunto. O ex-juiz disse que o nazismo é “abominável e inaceitável em qualquer circunstância”, sem fazer menção ao podcast do qual participou recentemente. Moro tem o apoio do Movimento Brasil Livre (MBL), do qual Kataguiri é um dos líderes. Já Doria afirmou que “a defesa do nazismo é um crime e uma agressão à humanidade”. E Ciro publicou que “sob nenhum pretexto se pode defender a criação de um Partido Nazista”.
A Confederação Israelita do Brasil (Conib) divulgou nota em que condena de “forma veemente” a defesa da existência de um partido nazista no Brasil e o “direito de ser antijudeu”, feita por Monark. Coletivos judaicos, como o Instituto Brasil-Israel e o Judeus pela Democracia, também condenaram as declarações.
Para a advogada e professora Thaís Marçal, coordenadora acadêmica da Escola Superior de Advocacia da OABRJ, a “liberdade de expressão não serve para incentivar o cometimento de crimes ou para a apologia, principalmente quando é um crime contra a humanidade, como é o caso do nazismo”.
Coordenador de História do Museu do Holocausto de Curitiba, Michel Ehrlich considera que Monark demonstra uma “enorme incompreensão da história” do nazismo e do holocausto, que matou 6 milhões de judeus, ao sustentar a defesa da criação de um partido com tal ideologia usando como argumento o fato de seus adeptos serem minoria no Brasil:
– Normalizar o discurso nazista só porque é minoria é justamente o que tornou possível acontecer o Holocausto.
Na tarde de ontem, Monark pediu desculpas argumentando que “estava muito bêbado” e que defendeu uma ideia “de uma forma muito burra”. Já Kataguiri afirmou que suas falas foram distorcidas.
TRANSCRITO DO JORNAL O GLOBO
FOTO: G1.GLOBO.COM