E agora?
“Bolsonaro já era”, comemorou uma amiga, após o final da apuração dos votos para presidente da República. Com uma voz estridente pela emoção – e certamente por algumas doses a mais de alguma bebida alcóolica -, ela quase berrava, ao telefone, que, agora, o Brasil estará livre do perigo do fascismo.
Amiga, sinto muito, o atual presidente apenas não foi reeleito, mas deixou o pior legado político possível para um país democrático: o bolsonarismo. Esse fenômeno protagonizado pela extrema direita envolve uma massa padronizada que rejeita os direitos humanos, que exalta a violência e o desrespeito às instituições, estimula a intolerância, criminaliza a imprensa e enxerga os outros que discordam de suas posições como inimigos a serem calados ou eliminados.
O bolsonarismo resiste fortemente. Esperneia. Ameaça. Pior para todos. Pior para o Brasil.
O cidadão brasileiro civilizado precisa se impor a obrigação de colaborar na tarefa de desconstruir esse movimento que dividiu famílias e invadiu igrejas, que confunde liberdade de expressão com liberdade de agressão. É preciso retomar a civilidade nas relações políticas e pessoais. Faz-se urgente frear a erosão da democracia.
Como deixamos o Brasil chegar a esse ponto? Como não deixar que o bolsonarismo ganhe ainda mais musculatura?
Esse terrível fenômeno assombra os defensores da democracia. E mesmo quem se mantém neutro, politicamente, não terá sossego e vai ter que aprender a conviver com uma extrema direita ensandecida e, agora, perigosamente rancorosa – e armada. Um rancor ameaçador, que toma o resultado da eleição quase como uma ofensa pessoal. Vingança será um sentimento dominante.
E a vingança, querida amiga, começa pelo Congresso Nacional, lotado de representantes dos xiitas da direita e que farão de tudo para inviabilizar o governo de Lula.
Não será fácil reconstruir o que foi destruído pelo governo Bolsonaro. Aliás, será dificílimo, mas não impossível. Os neofascistas vão perseverar e se retroalimentar com estímulos a reações dramáticas e a movimentos contínuos para frear ações de cunho progressista do novo governo. Senadores e deputados federais bolsonaristas agirão como verdadeiros terroristas, e o Centrão – ah, o Centrão! – continuará com a velha tática de guerrilha chantagista.
E agora?
Não serão tempos de ventos tranquilos. Ainda haverá tempestades e muita turbulência a ser enfrentada. Mas todos os verdadeiros patriotas, aqueles que querem um Brasil harmônico, livre de ameaças ditatoriais, terão que ser gloriosos partícipes dessa reconstrução nacional. Como? Desmentindo fake news, colaborando pela restauração das boas relações familiares e políticas, rejeitando o ódio e promovendo a paz.
Lula, em seu primeiro discurso após eleito, disse que líderes internacionais lhe disseram que o mundo estava com saudade do Brasil, hoje considerado um país pária. Essa sensação também é da maioria dos brasileiros que rejeitaram Bolsonaro. Saudade de um Brasil onde era possível ter adversários com civilidade, onde direita e esquerda se enfrentavam com firmeza, mas também com respeito.
Apesar do resistente bolsonarismo, façamos nossa parte por um país melhor.
Bem-vindo de volta, Brasil.
*Esse artigo também foi publicado no jornal A União desta segunda-feira