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ESPECIAL: Ecofoguetes reflorestam a Caatinga na Paraíba

As regiões de terras secas do mundo abrigam mais de 2,1 milhões de pessoas e a Caatinga é a mais populosa delas. Segundo o professor do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Helder Farias Pereira de Araújo, o bioma, porém, está cada vez mais degradado, inclusive na Paraíba. “Considerando a avaliação regional, cerca de 80% da Caatinga na Paraíba está degradada”, frisou Helder.

A devastação se arrasta por décadas e ameaça o equilíbrio ambiental. Diante dessa realidade, estudiosos criam projetos de restauração do ecossistema. Um deles é a pesquisa de doutorado de outro pesquisador da UFPB, o físico Renan Aversari Câmara, que usa ecofoguetes para reflorestar áreas da Caatinga paraibana. Batizado de “Dente-deLeão”, o projeto teve origem em 2020 e foi objeto de pesquisa no Programa de Pósgraduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRDEMA) da UFPB, sendo aplicado na Fazenda Salambaia, no município de Cabaceiras.

“Como agravante, o local se situa na microrregião do Cariri paraibano, caracterizado por ser uma das mais secas do país, com um dos menores índices de pluviosidade”, explicou Renan. Com formato cilíndrico (medindo 1,80m de comprimento e 100mm de diâmetro), os foguetes que disseminam sementes são movidos a água e ar pressurizado, não são poluentes e não têm processos de queima, evitando incêndios acidentais. Ainda são reutilizáveis. O único produto que deixa no ambiente é água, necessária à propulsão e desenvolvimento das sementes, por isso, foram chamados de ecofoguetes.

“Os foguetes movidos a água e ar pressurizados já existiam, utilizados sobremaneira em aulas práticas de física e também de forma recreativa por algumas pessoas ao redor do mundo. Contudo, nunca se deu uma aplicação diversa para a tecnologia, tendo esses ecofoguetes, com capacidade para dispersar sementes de forma controlada, sido desenvolvidos no âmbito dessa pesquisa”, explicou Renan.

De acordo com ele, a técnica tem baixo custo e após serem lançados, os equipamentos podem alcançar alvos de difícil acesso, como encostas, vales, terrenos rochosos e manguezais. As práticas desenvolvidas na Fazenda Salambaia mostram resultados promissores e, segundo Renan, podem ser usadas em uma área maior. “Como se trata de uma pesquisa, até então, não foi utilizado em larga escala. No entanto, a escalabilidade da técnica foi um viés pensado durante esse trabalho, tendo potencial para a pronta aplicação em projetos de reflorestamento e recuperação de áreas degradadas. Desta forma, a tecnologia se encontra apta a se somar às demais quando se trata de regeneração florestal”, frisou o pesquisador.

Renan Aversari contou que o estudo está tendo continuidade e já há planos para aplicá-lo de maneira mais ampliada. No entanto, como a ideia de expansão da escalabilidade da técnica está em fase de consolidação de parcerias, ainda não pode ser divulgada.

O tratamento dado às sementes utilizadas na pesquisa “Dente-de-Leão” é um capítulo à parte no estudo do pesquisadorRenan Aversari Câmara, começando pela seleção do tipo a serplantado. Segundo ele, houve o cuidado de escolher espécies estratégicas, com potencial de regeneração da cobertura vegetal, por causa de suas características pioneiras no processo de sucessão ecológica. Alguns exemplos de sementes lançadas via ecofoguetes são as de pinhão bravo, catingueira e mororó. Segundo ele, foram efetuadas campanhas de dispersão dessas espécies em zonas controladas e zonas livres, e verificou-se que as de pinhão bravo tiveram destaque na taxa de germinação e sobrevivência. “Tal resultado enaltece a capacidade de aplicabilidade da técnica. A título de exemplo, é possível dispersar cerca de 50 sementes encapsuladas por disparo, em uma área de, aproximadamente, 50x25m, em poucos minutos. Tal resultado confere velocidade e diminuição de custos, uma vez que o valor de um foguete para ser confeccionado fica por volta de R$ 200.”

Outro ponto importante na atividade, é o manejo aplicado às sementes. Elas são manipuladas de uma forma que facilite o processo de disseminação no terreno onde são lançadas, sendo encapsuladas para garantir a proteção contra predação. Além disso, são abrigadas em um substrato que retém a umidade por maior tempo, facilitando, assim, a respiração do embrião, além de otimizar o processo de dispersão. “Como parte do projeto, foi elaborada uma modelagem, ou um simulador, de forma a fazer previsões confiáveis de onde as sementes serão depositadas. Conhecendo as taxas de germinação das espécies, em campo, é possível efetuar a dispersão das sementes de modo a planejar com precisão os núcleos de regeneração num projeto maior de reflorestamento”, destacou Renan.

“Esses ecossistemas de terras secas (Caatinga) são naturalmente adaptados à variabilidade climática e ao estresse hídrico, no entanto, quando degradados, utilizados além da sua capacidade de suporte, passam a ser um dos mais vulneráveis, inclusive às mudanças climáticas”, afirmou o biólogo Helder Farias Pereira de Araújo, professor do CCA, da UFPB. O pesquisador, que tem estudo científico, sobre o assunto, publicado no periódico do grupo Nature chamado Scientific Reports, frisou que é urgente se aplicar formas de reflorestamento no bioma.

“É mais que urgente, é necessário se a sociedade brasileira estiver pensando em um desenvolvimento sustentável. Precisamos lembrar que a Caatinga da Paraíba já foi fonte de muita riqueza no passado com a agropecuária, basta lembrar da história do algodão, embora possamos listar vários exemplos. No entanto, terras antigamente produtivas, hoje são susceptíveis à desertificação, porque perderam sua estrutura ambiental de suporte que, inclusive, permitia maiores produtividades no passado”, ressaltou.

O pesquisador afirmou que planejar e restaurar paisagens na Caatinga deve ser uma prioridade, tanto com ações ativas de reflorestamento, como com tecnificação agrícola associada às condições do Semiárido e à recuperação dos serviços ecossistêmicos que a própria agropecuária depende. “Muitos ainda olham a biodiversidade e a proteção dos ecossistemas como um obstáculo para o desenvolvimento econômico, no entanto, várias pesquisas científicas mostram que a recuperação dos serviços ecossistêmicos pode, justamente, reverter a trajetória de degradação e, consequentemente, a geração de pobreza na Caatinga”, frisou.

 

Texto de Alexsandra Tavares para o Jornal A União

Foto: Divulgação

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