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Fingindo não saber

O presidente-executivo do Telegram, Pavel Durov, foi preso pela polícia francesa, sábado passado, por crimes relacionados ao seu aplicativo de mensagens. Havia um mandado de busca contra ele com base em investigações preliminares que apontaram uso do Telegram para fins criminosos.
Considerando a falta de moderação na plataforma, as investigações indicam que Durov teria sido, assim, cúmplice de tráfico de drogas, de crimes contra crianças e fraudes. Acreditou que poderia não ser responsabilizado pelas postagens dos usuários das plataformas. Esqueceu que não estava no Brasil. A França não admitiu que a plataforma fosse usada para postagens criminosas. Palmas para a França.
Aqui no Brasil, rola o “deixa quieto”, e pouco ou nenhum esforço se faz para controlar essas postagens. As redes sociais ainda são usadas para disseminar fake news e outros crimes graves. Enquanto a imprensa profissional é alvo de ações judiciais e multas, nas redes sociais ainda reina o paraíso da “liberdade” de dizer o que quiser, seja mentira, calúnia, seja incitação a crimes diversos e, de vez em quando, algumas verdades. Como se o direito à liberdade de expressão fosse absoluto, ilimitado.
A Justiça Eleitoral, frise-se, tem estado atenta, nesse período eleitoral, ao uso indevido dessas plataformas. Um dos candidatos a prefeito em João Pessoa tem sido alvo constante de multas por disseminar acusações não provadas. As multas, no entanto, não parecem frear esse ímpeto difamatório do candidato. São valores pequenos, compensam os estragos já feitos contra seus oponentes.
No Brasil, já houve tentativas de barrar os abusos dessa terra sem lei chamada “redes sociais”, mais especificamente contra o próprio Telegram. Em 2022, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, determinou que a atividade do aplicativo fosse interrompida por cumprir apenas parcialmente ordens judiciais relacionadas a perfis ligados ao blogueiro bolsonarista Allan do Santos. O Telegram não colaborava com as investigações, tão certo estava da impunidade. Mas, enfim, decidiu colaborar e o castigo foi suspenso pelo mesmo ministro.
Mas, apostando na impunidade, o aplicativo novamente descumpriu determinação judicial no interesse de uma outra investigação e, em abril de 2023, foi novamente penalizado pela Justiça, a pedido da Polícia Federal. No entanto, já no mês seguinte, a Justiça cassou a liminar que suspendeu o aplicativo. Simplesmente devido à falta de regras mais claras. O magistrado que devolveu ao Telegram a liberdade de atuação reconheceu que as leis são mesmo frouxas, pois, em sua justificativa, disse que a regulamentação das redes sociais no país “ainda é insuficiente” , carecendo de regras efetivas para evitar abusos e proteger usuários e sociedade.
O Legislativo brasileiro vota um sem número de leis sem sentido, ou bem casuísticas, mas está pouco se importando com um problema que afeta toda a sociedade: nas redes sociais, a “liberdade de expressão”, de extorsão, de perseguição e de cometer uma série de ilegalidades e crimes já fizeram muitas vítimas, fatais, inclusive.
Na França, apostar na impunidade pode acabar – e acabou – em cadeia. No Brasil, as regras são escorregadias. O próprio Judiciário reconhece isso, e não pode ir além da lei. Por que o Congresso Nacional não se ocupa desse tema tão primordial nos dias atuais? Por que tanto desinteresse?
Já está dando na vista esse comportamento de “finjo que não é comigo”.

 

Por Gisa Veiga

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