MPF processa “padrão estético” em escolas públicas militares
O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação no Acre para garantir que os estudantes de escolas públicas militares e cívico-militares tenham o direito de não seguir “padrões estéticos e de comportamentos baseados na cultura militar” que não tenham relação com a melhoria da educação. A ação tem efeito nacional, se for aceita pela Justiça.
De acordo com os procuradores, o caso envolve a proteção de direitos fundamentais, como liberdade de expressão, intimidade e vida privada. Por isso, as normas impostas pelos militares não deveriam se referir a cabelos, unhas, maquiagem, tatuagem ou formas de se vestir dos alunos.
A ação também solicita que as escolas “não punam os alunos por causa da sua aparência pessoal”. Para o MPF, a exigência de um padrão estético uniforme para os alunos tem um “impacto negativo desproporcional em pessoas de grupos minoritários”, além de mostrar uma “discriminação injustificável diante do atual regime constitucional”.
Entre as regras apresentadas pelas escolas militares está a de que “cabelos volumosos devem ser usados curtos ou presos”, enquanto os cabelos curtos podem ser soltos. Isso representa, segundo o MPF, um “racismo institucional contra as pessoas pretas e pardas, com cabelos crespos e cacheados”.
Ainda de acordo com a ação, “a valorização do cabelo afro é uma forma de luta e faz parte da redefinição da identidade negra”.
Visão limitada
O MPF argumenta que essas escolas proíbem, também, comportamentos como “mexer-se excessivamente” ou “ler jornais contra a moral e bons costumes”. Na avaliação dos procuradores, isso é incompatível com o Estado Democrático de Direito e com a liberdade de expressão.
Em nota, o procurador da República Lucas Costa Almeida Dias afirma que as restrições estéticas implantadas pelo modelo de militarização das escolas “seguem uma visão de mundo limitada da realidade, absolutamente incompatível com a virada paradigmática produzida pela Constituição Federal e, especialmente, sem nenhuma vantagem comprovada na experiência de aprendizado”.
Ele acrescenta que a recente deliberação do Executivo Federal de encerrar o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim) não repercute na referida ação civil pública porque “o objeto da providência judicial é mais amplo, já que também abarca o regime das escolas públicas militares estaduais e federais”.
A ação do MPF apresenta dados – inclusive de violência e abusos praticados em escolas militares – comprovando que a transferência da direção de escolas a militares sem experiência ou formação pedagógica, sob o pretexto de implantar disciplina, “acaba por importar para o ambiente escolar outras problemáticas da vivência militar”.