Saúde vê domínio de mulheres, mas liderança no setor é branca e masculina
Para pretos, pardos e indígenas, há ainda menos participação: eles ocupam apenas 9% dos cargos de liderança, contra 27% da força de trabalho da área.
As mais bem colocadas na categoria Serviços de Saúde, porém, contrariam essa realidade com alta participação de mulheres nos cargos de liderança. São elas a rede de farmácias Pague Menos e a Espaço Laser (MPM Corpóreos).
O levantamento das empresas mais diversas do país foi feito pelo Centro de Estudos em Finanças da FGV (Fundação Getulio Vargas) em parceria com a Folha. Os pesquisadores utilizaram dados de 2023 de empresas de capital aberto declarados à CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
A pesquisa avalia de forma separada companhias de 100 a 4.999 funcionários, como a Espaçolaser, e a partir de 5.000, tal qual a rede Pague Menos. No total, um universo de 418 empresas foi levado em consideração. A diversidade foi mensurada em cargos de média liderança, diretoria e conselhos de administração e fiscal.
Reduzir a disparidade na área não é apenas uma questão ética, diz Géssika Marcelo Gomes, médica nefrologista da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e integrante do Coletivo Preto D. Ivone Lara, da mesma instituição. “As pessoas tendem a seguir melhor os tratamentos quando se reconhecem nos profissionais”, afirma.
Pesquisa publicada no Journal of the American Medical Association no ano passado apontou que, para cada aumento de 10% no número de médicos negros na atenção primária, a expectativa de vida de pacientes da mesma etnia aumentava 31 dias.
A diversidade também é crucial para reduzir a discriminação e as microagressões, como as reveladas em estudo da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) de 2020 que constatou que mulheres negras têm 50% mais chances de não receber anestesia durante o parto em comparação com mulheres brancas.
A questão racial como uma problemática de saúde pública começou a ser falada mais profundamente durante a pandemia de coronavírus, que matou mais pessoas negras em relação às brancas devido às vulnerabilidades sociais do grupo.
Na Pague Menos, a transformação começou a se intensificar em 2021, com a formalização de uma área dedicada ao tema.
“Temos 12,9% de colaboradores autodeclarados pretos e 54,9% de autodeclarados pardos, ambos números acima da média nacional”, diz Rosi Purceti, VP de gente, cultura e sustentabilidade da rede.
O setor de varejo, especialmente para companhias como a nossa, presente em todos os estados do país, tem a responsabilidade de ter a diversidade da população brasileira refletida em seus quadros. Ao ter essa diversidade representada na nossa empresa, contribuímos também para uma relação empática de atendimento ao nosso consumidor direto
A partir de 2021, ações de sensibilização e capacitação ganharam corpo. Programas como o Gigante por Elas, voltado ao desenvolvimento de lideranças femininas, e iniciativas para formar líderes negros, reforçaram o compromisso com a equidade. “Esse movimento tem gerado maior engajamento dos colaboradores e um clima organizacional mais forte”, afirma Purceti.
Já na Espaçolaser, o gênero feminino domina todas as áreas.
“Mais de 95% da nossa equipe é composta por mulheres”, diz Mariana Gama Costabile, diretora de pessoas, ESG (sigla para boas práticas ambientais, sociais e de governança), cultura e performance da rede. “Além disso, cerca de 40% dessas líderes são pretas ou pardas, e nossa CEO, Magali Leite, é uma das poucas mulheres que lideram uma empresa aberta na Bolsa de Valores.”
No nosso dia a dia, a pluralidade tem um impacto profundo, visto que permite trazer diferentes perspectivas, ideias e pontos de vista para os desafios que enfrentamos
Segundo especialistas, a saúde deve se manter nesse caminho pelos próximos anos, contrariando uma tendência que já atinge multinacionais, de reduzir políticas de ESG e eliminar departamentos de diversidade, equidade e inclusão. Movimento, eles explicam, provocado pela polarização política e pelo aumento do conservadorismo no mundo.
“A discussão sobre saúde e racismo, antigamente pouco abordada, vem se fortalecendo na academia. No entanto, ainda vemos resistência em algumas áreas”, diz Priscila Surita, coordenadora do grupo de trabalho ESG da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados).
“É uma estratégia para aumentar o acesso de negros à pós-graduação”, afirma. “Ao segmentar por níveis hierárquicos, a proporção de pretos, pardos e indígenas diminui progressivamente à medida que se sobe na carreira. Isso resulta em uma representatividade muito pequena desses grupos nos cargos de alta gestão, que continuam majoritariamente ocupados por homens brancos.”
Saiba mais sobre as empresas de destaque na categoria de Serviços de Saúde
As notas de participação feminina e de pretos, pardos e indígenas, que vão de 0 a 100, foram calculadas levando em consideração a presença dos grupos em cargos de alta e média liderança. Os autores do estudo deram pesos diferentes para cada uma das categorias analisadas: enquanto diretoria e conselho de administração têm peso maior, uma vez que os membros têm maior poder decisório, a média liderança e o conselho fiscal têm peso menor.
- Empresas de 100 a 4.999 funcionários
ESPAÇO LASER (MPM CORPÓREOS S.A.)
Fundação 2004
Funcionários 4.500
Participação de pretos, pardos e indígenas 3,71
Participação feminina 45,97
Também levou nas categorias Diretoria e Sudeste
- Empresas com 5.000 funcionários ou mais
PAGUE MENOS
Fundação 2004
Funcionários 4.500 (em 2024)
Participação de pretos, pardos e indígenas 3,71
Participação feminina 45,97
Também levou nas categorias Diretoria e Nordeste
Folha/UOL
Foto de RDNE Stock project/Pexels